19 de julho de 2021
A Seção Latino-Americana da International Association for the Study of Popular Music (IASPM-AL) vem por meio desta manifestar seu total repúdio ao Parecer Técnico de 08/07/2021 da FUNARTE para o Projeto Pronac 204126 (Lei Rouanet), referente ao Festival de Jazz do Capão.
O referido parecer baseia-se em critérios pessoais, ideológicos e religiosos para sustentar a não recomendação de financiamento para o festival apoiando-se numa argumentação absolutamente anacrônica de que a música seria uma “arte divina, onde as vozes em união se direcionam à (sic) Deus”. O parecerista, obscurecido pelo fundamentalismo religioso mais superficial e desinformado, corrobora uma visão medieval de música sacra e chega a questionar a pertinência da classificação do jazz à categoria de “arte”.
Na direção oposta, sustentamos que, em seu sentido mais amplo, a arte é uma ação humana que auxilia na elaboração de ideias, reforça compartilhamento de símbolos e fornece coesão social. As práticas da chamada “música popular” – dentre as quais o “jazz” ocupa posição de destaque em termos de reconhecimento e legitimidade – são fundamentais para o convívio social, modulando modos de ser e estar no mundo, promovendo consensos e debates em torno de ideias e valores compartilhados. Por isso é extremamente importante e recomendável que o poder público financie festivais, shows e eventos que atendam a diferentes modalidades de sentidos, abarcando desde o campo religioso em suas várias tendências até os variados modos de fazer música distantes de preceitos religiosos ou místicos.
Desta forma, o parecer encontra-se em assombrosa dissonância com as perspectivas interpretativas vigentes em uma ampla gama de estudos sobre música em todo o mundo há mais de cinco décadas. Manifesta-se assim, uma posição extremista incompatível com a histórica importância da FUNARTE enquanto entidade fomentadora de cultura do Estado brasileiro, laico e inclusivo como descrito em nossa Constituição.
Finalmente, recomendamos que o parecer seja invalidado pelas instâncias superiores da Fundação, sendo o exame do projeto redirecionado para parecerista que tenha competência para fazê-lo.
Atenciosamente,
IASPM-AL